segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Professor "avaliador": o que temos, de fato, avaliado?

   "Esses alunos são esquisitos, alguns são feios mesmo."
   "Moleque burro! Não aprende nem se eu explicar 200 vezes."
  "Já repararam que aquele menino é sujo? Parece que não toma banho..."
   "Tomei uma cantada daquela garota do 8° ano que me deixou sem graça."
   O professor que está na escola e que nunca ouviu ou disse uma das frases acima que atire a primeira pedra ou pare de ler este post.
  Não tem jeito. Julgamos nossos alunos o tempo todo. E este julgamento é indicador não apenas da natureza humana do professor mas, sobretudo, do pano de fundo ideológico que sustenta a prática pedagógica. 
   Avaliamos nosso aluno, sua postura, seu jeito, seu linguajar, o estado de suas roupas, seus dentes, o modo de se sentar, se tem celular ou iPhone e por aí vai... Não avaliamos apenas seu conhecimento, se ele aprendeu ou não o conteúdo dado em aula. A ilusão de que uma prova, um teste ou um trabalho "medem" a aprendizagem da forma mais idônea possível atravessa o tempo todo o cotidiano do professor, mesmo daquele que "sabe" que avaliar não é um ato objetivo.
   Isso que estou escrevendo aqui não é algo inovador ou pioneiro. Lá nos idos de 1999, na minha graduação, já discutíamos essa questão baseados em textos de Maria Teresa Esteban e Cipriano Carlos Luckesi (datados daquela década). Foi fundamental para minha atuação como professora de ensino fundamental ter realizado tais leituras e os debates fomentados na disciplina de Didática Especial. 
   Mas... 
  Quando entramos em sala de aula a realidade é, às vezes, cruel. E na sala dos professores, então? 
   Não nos damos conta quando pensamos ou comentamos com um colega alguma coisa parecida com aquelas frases que citei lá no início. Esquecemo-nos completamente que somos ensinadores de conteúdos mas somos, antes de tudo, formadores de caráter e de valores. Não há como ser incoerente e pronunciar um discurso progressista e exercer uma prática opressora.
   Por que será que aquele aluno(a) chegou na escola com o uniforme sujo e amassado? Por que ele(a) tem problemas de aprendizagem? Por que aquele(a) aluno(a) com apenas 14 anos sentiu-se encorajado(a) a flertar com o(a) professor(a)? Em que realidade social esses alunos/essas alunas vivem?
   Sempre que (re)leio os Parâmetros Curriculares Nacionais deparo-me com o slogan da "formação para a cidadania". Sem querer entrar no mérito do que seria esta "cidadania", mas será que quando eu avalio (tacitamente) meus alunos eu estou contribuindo para tal formação? Será que eu reflito sobre as questões que coloquei anteriormente? 
   Na rotina avassaladora de cumprimento de programas curriculares e preparação para avaliações as mais diversas a questão dos valores acaba sendo secundária e fica implícita em nossa prática. E aí, onde fica a tal cidadania?
   Esta reflexão está longe de ser restrita a professores de ciências. Todos nós professores, em qualquer nível de ensino, somos formadores de opiniões, de caráter e de valores. Porém, tenho percebido que o professor de ciências acaba se aproximando de questões pessoais dos alunos e várias vezes quando ensinamos conteúdos como corpo humano, ecologia e evolução tocamos no íntimo do(a) aluno(a) e ele(a) passa a se perguntar - e, com certa frequência, acabam nos perguntando - por que o corpo dele(a) é daquele jeito, por que sua rua tem falta constante de água, por que ele ouviu na igreja que descendemos de Adão e Eva. Neste momento, não lidamos apenas com questões científicas. E, muitas vezes, quando eles se posicionam acabamos impondo nosso ponto de vista e "avaliando" como sendo "incorreta" e até mesmo debochando sobre algumas de suas observações.
   Esta tênue linha entre o que ensinamos e como avaliamos perpassa o tempo todo o cotidiano da sala de aula. 
  Todos nós, professores, em algum momento avaliamos de forma depreciativa algum(a) aluno(a); se oralizamos ou não esta é outra questão. Mas também acredito que este seja mais um aprendizado que o professor pode/deve elaborar no decorrer de sua  atuação no magistério. Somos humanos, sim. Erramos. Porém, não podemos nos eximir jamais de nossa responsabilidade enquanto formadores de outros seres humanos.

Voz do Professor - Marcus Vinicius Jr.


Relato como professor de Ciências e Biologia.
Recente na carreira do magistério (4 anos apenas), exclusivo de colégios públicos, me questiono quanto à colocação de professores já em final de carreira: "Você é e pensa deste jeito promissor, pois ainda é novo na carreira!".
Quando iniciei, fui "jogado" nas turmas. E a mística da realidade inicial é exatamente o você NÃO SABER O QUE FAZER, bem diferente dos planejamentos ao longo da licenciatura. Uma realidade assistida é a falta de estrutura que, infelizmente, a grande maioria dos colégios públicos oferecem! E como professor de Ciências e Biologia, envolver os alunos no saber da VIDA requer uma apresentação bem convincente.
Muitas são as idéias, mas pouco é o tempo com as diferentes turmas. Tempo para um público que necessita mesmo de um pouco mais de tempo para envolvê-los. Impacto de início. É se confrontar com uma realidade bem dolorosa. Tudo para se desistir. Tudo para ceder ao "discurso dos que estão em final de carreira do magistério".
Mas a realidade dos alunos é envolvente. A pouca estrutura se transforma em criatividade e os alunos são a peça-chave. Aprendi a desenvolver minhas aulas junto com a vida e o cotidiano dos alunos. Me inseri no mundo deles. Utilizá-los como exemplos em uma aula sobre Corpo Humano, ou fazê-los serem moléculas e mostrar uma "reação química" entre eles. E neste ambiente, é o que vale. Não há como fugir. Mas existe sim a possibilidade de se envolver.
Cada ano fica melhor. São turmas com perfis diferentes. Alguns novos e outros você já vem acompanhando há anos. E assim é a dinâmica. Me envolvo cada vez mais. E me pergunto: "Quando chegará a hora de não ser ou não pensar mais, por não ser mais novo na carreira?"
Marcus Vinicius Jr.
Professor Docente I - Ciências Físicas e Biológicas - SEEDUC-RJ e Ciências - SME - RJ

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Apresentando a "Voz do Professor"

Caros colegas educadores,
chegamos às 1.000 visitas ao Blog Ensinando Ciências na Escola e para comemorar estou lançando uma nova seção, a "Voz do Professor". Nela será dada a oportunidade para que professores de ciências em atuação nas escolas ou ainda em processo de formação inicial tragam suas reflexões sobre a prática docente e sua realidade escolar ou universitária.
Tenho o imenso prazer de inaugurar a "Voz do Professor" com o relato de um ex-licenciando meu, aluno de minhas disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado no ano de 2006 na UFRJ. Marcus Vinicius Júnior é, após uma longa jornada de estudos acadêmicos (ele possui duas graduações), atualmente professor de educação básica das Secretarias de Educação do Estado e do Município do Rio de Janeiro. Suas reflexões são inspiradoras e nos fazem encarar a escola como espaço de negociação de saberes e de aprendizado constante com os diferentes atores sociais que lá estão presentes.
Vai lá conferir! 
Está na aba direita do Blog.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

“E que tipo de professor(a) eu posso ser?”



Está lá, na maioria dos artigos de pesquisa da área de educação em ciências, o destaque para a necessidade de que sejam inseridos e discutidos aspectos relacionados à natureza da ciência em cursos de formação inicial de professores. Como estou tendo a primeira experiência docente no curso de Pedagogia senti-me quase que obrigada a promover esse tipo de discussão com meus alunos. Além disso, falamos sobre quais seriam os objetivos do ensino de ciências gerais e aqueles que seriam específicos das séries iniciais do ensino fundamental. Tivemos debates bastante produtivos de cunho epistemológico e fui surpreendida com reflexões que abarcaram contribuições da Sociologia, Psicologia e da Filosofia que foram trazidas pelos próprios alunos.
            Porém, uma questão tem sido latente durante essas aulas. Eles se perguntam – e externalizam o conflito em várias ocasiões – sobre como podem ser professores de ciências alinhados a uma perspectiva investigativa e crítica se: 1) não vivenciaram esse tipo de ensino quando eram alunos da escola básica, 2) não estão sendo formados para isso na universidade e 3) a escola na qual eles possivelmente atuarão exigirá deles o cumprimento de um currículo abarrotado de conteúdos. Certamente que eu não tenho soluções prontas para cada um desses impasses e temos conversado sobre eles um pouco a cada aula e tenho tentado mostrar que não é porque nossa formação escolar foi deficitária que não podemos romper com o modelo de professor de ciências com o qual convivemos. A universidade serve é para isso mesmo: refletir sobre nossos modelos pedagógicos, fornecendo as bases teóricas e práticas para que eles possam elaborar seu próprio modo de agir e pensar a educação e o ensino. Aí chegamos ao ponto que eu queria destacar. Eles se queixam que a universidade não tem dito a eles como eles devem ser enquanto professores. Parei, então, para pensar em como tinha sido a minha formação inicial e se ela tinha sido eficaz a ponto de me tornar uma professora crítica e, usando um termo que meus alunos usam muito, “diferenciada”. Sim, eu era uma professora crítica e diferenciada, no entanto, isso não era suficiente para conseguir romper, em várias ocasiões, com um modelo de ensino transmissionista e conteudista. Culpa minha? Culpa da escola? Culpa da universidade que não me formou direito? Culpa do sistema?
            Acho que antes de procurar os culpados temos que analisar o que há de possibilidade de transformação da ação docente. Observando a minha trajetória, percebo que foi apenas no momento em que exerci o magistério que pude relacionar minha aprendizagem teórica e prática da licenciatura com os saberes que eu produzia cotidianamente em minhas salas de aula. Dia desses até brinquei com meus ex-alunos do ensino fundamental (tenho contato com vários deles por meio de uma rede social) de que eles foram minhas cobaias e que sempre me recordo de alguma situação vivida na escola com eles da qual extrai um aprendizado sobre a prática docente que só quem está em sala de aula tem.
             Quando estava dando uma aula sobre linguagem no mestrado uma aluna, professora de biologia, disse que realiza atividades com seus alunos que ela nunca havia atentado para o fato de que ela estimulava determinadas habilidades de leitura por meio do contato com textos alternativos ao livro didático. Esta é uma característica muito relevante do trabalho docente: o tempo todo o professor utiliza a sua “intuição” (faz esta atividade, funciona, faz na outra turma, já não dá tão certo, re-elabora, implementa de novo, produz seus textos e materiais e por aí vai) e com o tempo ele vai desenvolvendo e aprimorando este saber docente que, não tem jeito, ele não vai aprender só na universidade.
            Então, retomo o que tinha escrito acima. É fundamental sim colocarmos os licenciandos em contato com a produção teórica da educação, da filosofia, da sociologia, da psicologia e da educação em ciências porque, mais cedo ou mais tarde, aqueles textos farão algum sentido e pode ser que eles nem se lembrem dos autores, dos conceitos mas se recordam que discutiram aquilo no passado e se quiserem conseguem recuperar a fonte, aprofundar seus estudos e “teorizar” sua prática.
            A angústia a qual me referi anteriormente é típica de qualquer profissional que está prestes a entrar no mercado de trabalho (cruel, altamente seletivo e que, algumas vezes, se utiliza de critérios obscuros e duvidosos para dizer quem é “bom” e que não é) e na educação não é diferente. Hoje, a educação também tem sido tratada como mercado e os egressos de nossas licenciaturas daqui a pouco estarão competindo com o colega por um cargo público ou por uma vaga em uma escola particular. Mas este é um outro assunto que podemos retomar outro dia.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Ensino, pesquisa e extensão. Como?!



            Está posto. Os pilares da universidade são o Ensino, a Pesquisa e a Extensão. Quando entramos na universidade pública como alunos nos deparamos com um ensino quase sempre de qualidade mas que deixa a desejar em vários aspectos. No entanto, geralmente nos orgulhamos por sermos alunos de pesquisadores de ponta na sua área. E quando a gente “crescer” quer ser que nem eles. Quer ter um laboratório, ver seu sobrenome estampado em revistas internacionais e viajar o Brasil e o mundo participando de congressos e dando palestras para gente tão ou melhor do que você. Raramente, na graduação, nos envolvemos com a Extensão. É, aquele outro pilar da universidade que sempre fica ali, no cantinho, que quase sempre somente é valorizado quando o professor/pesquisador universitário precisa preencher um campo no formulário de progressão de carreira para somar pontos.

            Não. Não estou sendo severa com meus colegas. Critico uma parte deles sim na medida em que apenas se recordam da Extensão nesses momentos. Mas se pararmos para pensar e analisar bem o porquê disso vemos que o problema é muito mais “embaixo” ou “em cima”, dependendo do ponto de vista.

            O professor universitário lida com demandas internas e externas à universidade. Ele tem que dar aulas na graduação e na pós-graduação pois existe uma carga horária mínima que ele deve atender. Mas ele também tem que fazer pesquisa. Sabe por quê? Não, não é apenas para ser reconhecido por seus pares ou fazer uma descoberta científica que mudará o mundo. Porque os recursos que subsidiam a compra de materiais permanentes e de consumo das universidades públicas vêm, principalmente, das verbas obtidas nesses projetos de pesquisa. Então, a vida do professor/pesquisador universitário brasileiro é escrever, submeter e executar projetos de pesquisa para conseguir dinheiro para manter, em mínimas condições, seu trabalho. Mas esse dinheiro não deveria vir diretamente dos Governos Federal e Estadual? Sim, ele vem. Mas ele não é suficiente. É por isso que temos observado cada vez mais (e com grande força) a entrada de verbas privadas, na forma de convênios com empresas multinacionais, em alguns setores da universidade pública. Que setores? Aqueles que atenderão a formação de demanda de mão de obra qualificada para atuar nessas empresas. Mas e as humanidades? Tem havido subsídio para a formação de professores, filósofos, sociólogos, psicólogos e historiadores? Raramente, quase nunca. Os professores/pesquisadores que atuam nas áreas humanas são aqueles que mais precisam das verbas oriundas dos projetos de pesquisa sustentados por agências de fomento públicas. E, coincidência ou não, me parecem ser aqueles que mais se envolvem com aquele pilar esquecido (a Extensão).

            E por que isso? Assim, que entrei na minha atual universidade pensei em colocar em prática um antigo projeto meu de trazer alunos da escola básica para a universidade. Escrevi um projeto de extensão, convidei professores e pesquisadores de várias instituições de ensino e de pesquisa do RJ e todos aceitaram. Logo em seguida percebi que não receberia um centavo para a execução do projeto. Teria somente direito a bolsas de extensão para alunos da graduação. Se não recebemos verba para realizar atividades de extensão: 1) por que perdermos tempo com ela já que temos tantas aulas para dar e pesquisas a executar? e 2) por que valorizar a extensão se dela não se originam artigos de pesquisa que iremos publicar, engordar nosso Lattes e conseguirmos bolsa de produtividade? Não, não há reconhecimento pelo engajamento em atividades extensionistas na universidade. A comunidade acadêmica olha essas ações muitas das vezes como sendo assistencialistas. E há quem encare a extensão como forma de “doutrinamento” e “iluminação” da população que está além dos muros da universidade.

            E o que isso tem a ver com a escola ou com o ensino de ciências na educação básica? Respondo com outra pergunta: como fazer chegar à escola, aos professores e, lá na ponta, aos alunos os resultados inovadores (considerando que eles assim sejam) de nossas pesquisas que visam à melhoria do ensino? Não precisa ser um grande intelectual para perceber que a relação entre pesquisa, ensino e extensão é (deveria ser) um processo de retro-alimentação da universidade pública que está inserida na sociedade e que, ao mesmo tempo, determina algumas de suas relações.

            Essa discussão passa ao largo do dia a dia do professor universitário. São tantas tarefas a cumprir que ele entra em uma ciranda automática de execução de atividades que o torna mais uma peça no sistema. (Qualquer semelhança com o cotidiano do professor escolar não é mera coincidência.) Resta perguntarmos a nós mesmos a quem isso interessa e se queremos continuar nesta rotina cruel e pouco produtiva do ponto de vista humano.

domingo, 2 de dezembro de 2012

"Porque ciências é difícil e eu não entendo."


Até quando as crianças vão acreditar que fazem provas e exercícios para reproduzir o que foi dito pela professora ou o que está escrito no livro? Por isso, ciências é chato. É decoreba e nada faz sentido. São maus alunos (se vêem assim) e cada vez se interessam menos pelas explicações científicas e perdem a curiosidade. Dói por dentro estudar ciências com minha filha. Entendam que não estou criticando diretamente os professores. Antes disso esta é uma crítica a mim mesma e a todos os formadores de pedagogos. Agora, mais recentemente, estou também assumindo essa responsabilidade e nesse sentido tenho procurado discutir com os futuros professores dos pequenos que ensinar ciências para criança não é despedaçar o corpo humano como um frankenstein em vários órgãos e sistemas ou simplesmente despejar um monte de conceitos científicos sem qualquer tipo de conexão com os fenômenos naturais que eles vivenciam e têm, a princípio, tanta curiosidade. E isso não é apenas nas aulas de ciências, não! Geografia e história também são ensinadas assim. Tudo no “melhor” estilo transmissionista que é criticado pela academia há décadas.
Nessas horas eu me pergunto: e o belíssimo discurso da educação crítica para a formação de cidadãos baseada no construtivismo (“febre” educacional e slogan dos Parâmetros Curriculares Nacional)? Essa fala própria dos especialistas já deixou a academia há bastante tempo e já foi incorporada pelo discurso escolar; basta observar que vários Projetos Políticos Pedagógicos de escolas particulares e públicas enunciam esse objetivo geral da educação sem que necessariamente suas ações pedagógicas tenham sido significativamente modificadas.
São em momentos como esse que compreendo a impotência que alguns professores que assumem o compromisso para si de implementar práticas educacionais que visam à constituição de valores e à aprendizagem significativa pelos alunos sentem quando se deparam com um sistema que está imerso em um discurso inovador mas cujas práticas são arcaicas e tradicionais. E daí vem a tradicional questão que ouço em minhas aulas de licenciandos que já estão em sala de aula: “mas, como fazer diferente? Como romper com o sistema?”.
Eu sei que sozinha não mudarei a educação infantil. Sendo otimista e pensando que a maioria dos professores universitários pense como eu e esteja trabalhando nesse sentido, ainda assim não temos garantia de que haverá uma melhoria no ensino de ciências para as crianças. Por quê? Porque isso não depende apenas do professor que está em sala de aula. E, dialeticamente, a mudança e a melhoria do ensino passam diretamente pelas ações deste professor.
Acho que passou da hora de tratarmos de forma profissional a educação das séries iniciais. E não será apenas em um debate interno, constituído apenas por pedagogos e especialistas em educação infantil, que conseguiremos avanços efetivos. Temos que ouvir os professores incluí-los nas discussões para conseguirmos discutir se aquele slogan da/para educação faz, de fato, sentido na prática.
Só para finalizar. Esta semana li uma entrevista com a Profa. Magda Becker Soares na qual ela fala sobre as funções da Educação Infantil sobretudo do aspecto do desenvolvimento cognitivo e social da criança. Vale à pena conferir (em http://revistaeducacao.uol.com.br/textos/0/aprendizagem-ludica-240352-1.asp).

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Por que o professor que estuda mais sai da escola?



Em um determinado momento de minha trajetória profissional “tive” que escolher: ou seguia dando aulas no ensino fundamental ou dava continuidade aos estudos. Tinha meus projetos pessoais e também queria fazer bem feito aquilo a que eu me propusse fazer. E não vou mentir: tinha que avaliar as condições financeiras que enfrentaria ao longo de minha vida. Será que é apenas visando o acréscimo do salário (que todos nós sabemos que é ínfimo) que alguns professores dão prosseguimento formal e sistematizado aos seus estudos?
Fiz questão de destacar os termos acima porque, para mim, é quase óbvio que professor que não estuda tem sua morte intelectual decretada uma semana depois de sua formatura (e não estou me referindo apenas a atualização de conteúdos). Dizem que essa é uma verdade para qualquer profissão no mundo atual no qual a produção de conhecimentos se dá em uma velocidade absurda e sua divulgação e acessibilidade (via televisão, rádio e, principalmente, Internet) está aí para quem se interessar. Nossa profissão, especificamente, requer o contato com o que está sendo pensado e produzido por outros educadores, além de filósofos, psicólogos e sociólogos da educação. A ideia de que o conhecimento e as experiências devem ser compartilhados entre aqueles que estudam e vivem a realidade da educação e do ensino não é apenas um chavão é, sim, uma demanda concreta de aprimoramento do trabalho docente.
Voltando à questão que intitula este post: por que será que o professor que estuda, que se especializa em sua disciplina, acaba saindo da escola? Tem professor mestre ou doutor em escolas públicas (por favor, excluam os Colégios de Aplicação, o Pedro II e os Colégios Militares) e na grande maioria das escolas particulares? Sabemos que a resposta é negativa. Baseada no que tenho vivenciado na minha ainda curta experiência profissional posso dizer que boa parte de meus ex-licenciandos que fizeram mestrado, ao avistarem a possibilidade de receberem bolsas, abandonaram seus cargos nas escolas. Isso aconteceu comigo. Minha pergunta é: por que esses professores não voltam para as escolas ao término da pós-graduação stricto sensu? Sabemos que hoje existem os mestrados profissionais que pretendem justamente aprofundar a formação dos professores atuantes nas escolas visando, em última instância, a melhoria do ensino. Posiciono-me favorável a realização desses cursos desde que eles não se tornem uma mera “capacitação de luxo” de longa duração em centros universitários de excelência. A realidade é que boa parte daqueles que optam pelo mestrado (acadêmico), quando conseguem a licença ou o afastamento remunerado nas redes municipais e estaduais, retornam às escolas desestimulados e ansiosos por voltarem (definitivamente) ao ambiente acadêmico. É triste constatar que a escola é um objeto de estudo que rende dissertações e teses em um número gigantesco a cada ano e que os próprios professores, quando assumem o papel de pesquisadores, acabam se afastando daquele cenário (algo que não pode ser naturalizado e que devemos refletir a respeito).
Faço, ainda, outra pergunta: a rotina do profissional da educação faz com que ele tenha que optar, em algum momento, pela academia ou pela escola? Quando emprego o verbo Ter estou ressaltando a obrigatoriedade da escolha, ou melhor, a impossibilidade de conciliação entre o estudo, a pesquisa e a atuação docente. Tem como continuar sendo professor (na escola) e assumir o papel de pesquisador (na universidade) sem que haja uma sobreposição de papeis? Esse perfil profissional seria interessante para as duas instituições? Alguns poderão (apropriadamente) mencionar perspectivas teóricas e metodológicas como a pesquisa-ação ou os estudos sobre professores pesquisadores. Mas não são a estas “saídas” próprias da academia a que me refiro. Estou tentando suscitar uma questão muito mais de cunho prático (e, convenhamos, são com questões pragmáticas que o professor lida no seu dia a dia) que nos leva a refletir sobre as reais demandas do professor e das possíveis (e concretas) relações que um professor que está na escola pode estabelecer com a universidade (sem que ele tenha que optar por uma delas!). Neste momento, os formadores de professores (estou inclusa aqui) retrucarão: “temos projetos de extensão, promovemos cursos de formação continuada, organizamos eventos científicos que buscam o diálogo com o professor da escola”. Correto. Mas, ainda assim, parece haver aí um interstício considerável no que diz respeito à aproximação do professor com aquilo que está sendo pensado na academia. Não é a toa que os professorem frequentemente reclamam das pesquisas que não retornam à escola e das imposições que vêm de “cima para baixo”.
No final das contas, uma coisa não podemos deixar de reconhecer: ao ocupar o status daquele que “discute de fora” a educação, o professor jamais voltará a ser o mesmo. Se isso é bom ou ruim deixo para que cada um que viveu (vive) a situação que reflita e compartilhe com seus pares.
Devo confessar que acerca desse assunto possuo muito mais perguntas do que propriamente respostas definitivas. Algo que, por um lado é angustiante, mas que por outro tem me estimulado a refletir sobre as questões mencionadas.
Depois que sai da escola, tornei-me estudante de pós-graduação e já ao final do doutorado assumi o cargo de professora universitária. Assim, somente retornei a ela na figura de professora supervisora de licenciandos que estagiavam na educação básica. Outro lugar social, um olhar distinto sobre as relações que acontecem na escola. Esta mudança certamente suscitou em mim inúmeras perguntas – algumas delas eu venho buscando transformar em questões de pesquisa – e explorarei outras aqui no Blog em devidas oportunidades.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Professor(a), eu?

Ninguém nasce professor assim como ninguém nasce dentista, engenheiro, jogador de futebol ou técnico de informática. O “dom”, a “vocação”, o que quiserem chamar, para o magistério é algo, no mínimo, ultrajante para uma carreira que requer tanto estudo e dedicação ao longo da formação inicial e continuada. Acredito que parte da desvalorização da profissão docente na sociedade atual decorre dessa visão errônea.
Daí também se deriva a ideia de que o magistério pode ser um trampolim para outras carreiras. E tive a constatação disso em meu primeiro dia de aula em uma turma de calouros da licenciatura em Biologia. Como sempre dei aulas para turmas concluintes dos cursos de licenciatura (nas disciplinas de Prática de Ensino, Estágio Supervisionado e Trabalho Final de Graduação) eu nunca senti a necessidade de questionar os alunos sobre suas motivações pela escolha do magistério. Pensava que se eles estavam concluindo o curso era porque eles tinham convicção de que seguiriam atuando na escola. Hoje eu me questiono sobre isso...
Voltando aos calouros. Como queria ter um perfil da turma e uma ideia de suas visões de ensino e da Biologia pedi para que eles completassem duas frases. As respostas foram separadas em categorias por afinidade de sentidos (tive a ajuda de dois alunos) e colocadas no quadro para que pudéssemos discutir o resultado depois. A primeira frase “Eu quero ser professor de Biologia...” foi a que apresentou menor variedade de respostas mas, certamente, estas foram as que mais me surpreenderam. Dos 34 licenciandos presentes, 11 disseram que não queriam ser professores, eles estavam ali porque não conseguiram aprovação em outros cursos, inclusive no bacharelado que é mais concorrido. Vários deles demonstraram em nossa conversa que tinham interesse em pesquisa em diversas subáreas da Biologia e desconheciam a pesquisa em ensino de Biologia. As respostas dos demais oscilaram entre “porque eu gosto de ciências/biologia”, “porque eu tive bons professores de biologia que me influenciaram”, “porque eu quero ensinar biologia”. Esta última foi a que apareceu em menor número além daquelas respostas que não foram agrupadas.  Confesso que fui pega de surpresa com algumas das respostas porque ficou claro que a escolha pela licenciatura não é necessariamente feita pela intenção explícita de atuação no ensino. Por outro lado, elas confirmam de algum modo o que coloquei acima: ninguém nasce com o “dom” para o magistério. Isso é algo que é descoberto e que pode ser valorizado (ou não) pela pessoa fazendo com que ela opte (ou não) por se tornar (e se formar) professor. A segunda frase “Um bom professor de Biologia é...” gerou respostas diversificadas. Vários comentaram a importância do professor despertar a curiosidade e o interesse dos alunos pela Biologia a partir de atividades lúdicas e da interação com estes. Outros disseram que o bom professor de Biologia é dinâmico, crítico, atualizado, bem humorado, inovador e respeita o aluno. Os termos “louco” e “maluco” apareceram em duas respostas no sentido de ser descontraído e inquieto perante o saber. Alguns comentaram que ele deve dominar o conteúdo para ensiná-lo ao aluno e outros ressaltaram que esta não é condição exclusiva para o bom desempenho do professor. Uma resposta em especial gerou bastante discussão: “é aquele que representa a ciência”.  Acho que dá para imaginar o motivo.
Abro pequeno parêntese aqui para dizer que na apresentação dos alunos na disciplina de Ciências da Natureza do curso de Pedagogia obtive a informação parecida, ou seja, a maioria dos futuros pedagogos não pretende ser professor (e estes estão já no sexto período!).
De forma geral, esta atividade simples me levou a refletir sobre questões relacionadas à construção da identidade docente e da própria opção pelo magistério. A formação inicial destes licenciandos deve ser quase impecável no sentido de que devemos fazer com eles reflitam sobre o que é ser professor (de ciências e biologia) pois não podemos jamais apresentar a prática docente como atividade simplista, transmissionista e mecânica (neste caso, qualquer um poderia ser professor, não é mesmo?). Espero, ao menos, conseguir deixar aquela sementinha plantada nas mentes deles agora no início para que ela germine no decorrer de sua formação.

sábado, 10 de novembro de 2012

Revistas para o professor e sobre a escola: formadoras ou “modeladoras”?



Época de planejamento de disciplinas novas é sempre cansativa mas bastante produtiva também. Além disso, por causa da própria criação deste blog tenho exercitado algumas habilidades na Web que nunca tinha experimentado. Observei que (quase) tudo que se queira aprender, acessar ou simplesmente matar a curiosidade pode ser encontrado no “milagroso” site de buscas do Google. Por meio dele, estou tendo a oportunidade de encontrar materiais os mais diversos sobre educação, entre eles uma quantidade considerável de revistas destinadas a professores ou gestores escolares.
Confesso que costumava a ver essas revistas com maus olhos. Talvez por não conhecê-las com profundidade ou por até mesmo ter aquele olhar “superior” de quem tem o pé muito fincado na academia. No entanto, tenho encontrado textos de todos os tipos, para os mais variados gostos e necessidades e, é claro, com qualidades diversas.
Os textos dessas revistas vão desde reportagens de divulgação científica, entrevistas (com educadores, cientistas de diferentes áreas, políticos e por aí vai), relatos de experiências docentes ou escolares de sucesso (sob o ponto de vista daquele que escreve), resenhas de livros até anúncios e divulgação de eventos e cursos de atualização. Ou seja, uma gama de textos que podem atender às necessidades daqueles que os buscam. Acredito que o mais importante nesse tipo de relação entre aquele que procura a informação e aquilo que é oferecido não é a qualidade do que ele acha mas sim o seu discernimento efetivo de perceber se o texto que ele encontrou atende aos seus interesses e está alinhado às suas concepções de ensino. Alguém poderia pontuar: “não tem jeito, existem textos que são muito ruins e deveriam ser impedidos de circularem na Internet”. No entanto, eu acho que o pior não é a condição “ruim” de um texto (condição subjetiva, convenhamos) e sim o leitor/professor não ter clareza de seus propósitos enquanto educador e reproduzir práticas e discursos sem qualquer tipo de reflexão.
Há problema em pegar um vídeo ou uma aula pronta ou utilizar um roteiro de um experimento? Em minha opinião haveria caso o professor simplesmente reproduzisse o vídeo, a aula ou o experimento de forma mecânica. Às vezes o “puritanismo” da academia impede o reconhecimento de questões básicas e triviais do dia a dia do professor da escola básica. Ele tem que dar conta de questões práticas e se tem algum material que o inspire a inovar em suas aulas, dinamizar seu cotidiano ou estimular a participação de seus alunos desde que ele se aproprie de maneira crítica do material, qual é o grande obstáculo nisso?
Voltando às revistas, mais especificamente sobre a qualidade de seus textos, notei que a variedade é mais positiva do que negativa porém a leitura tem que ser perpassada por um olhar atento sobre aquilo que está sendo dito e o que pode estar nas “entrelinhas” (os importantes “não ditos”). Algo que costuma me ajudar nesse sentido é prestar atenção na autoria do texto e no próprio editorial da revista. No mais, sejamos cautelosos mas preconceituosos jamais.

domingo, 4 de novembro de 2012

Sobre a circulação dos conhecimentos produzidos nas universidades



Eu já havia redigido o texto que postaria aqui no blog hoje mas mediante uma circunstância divulgarei outro que tem a intenção de ser breve e questionador.
Na busca por textos (relatos de pesquisas) que abordam o tema livro didático de ciências das séries iniciais deparei-me com a dificuldade de encontrá-los e comecei a me perguntar: “será que ninguém nunca pesquisou esse tema?”. Imediatamente recordei-me que ao realizar a revisão bibliográfica de minha dissertação de mestrado, cujo objeto de análise era o livro didático do ensino fundamental, encontrei uma quantidade considerável de artigos que tinham esse mesmo objeto. Será que neste conjunto de pesquisas não há nada sobre as séries iniciais? Para não ser injusta, nessa busca que se concentrou em 2 ou 3 horas de trabalho na internet, localizei três textos publicados em periódicos da área de educação em ciências com esse foco. Mas... Apenas três? Será que as pesquisas sobre livro didático que tantos revisores disseram que estavam saturadas não contemplam esse tema? Ou será que quem está pesquisando isso simplesmente não divulga seus resultados?
Assim, cheguei à questão que me incomoda bastante desde que defendi o mestrado. Como promover a circulação dos conhecimentos produzidos nas dissertações e teses da nossa área?
Existe, ainda, uma enorme distância entre a produção do conhecimento na academia e a socialização do mesmo com os pares e a comunidade escolar. Vários programas de pós-graduação têm cobrado de seus alunos que publiquem (ou pelo menos submetam) um artigo antes da defesa. A iniciativa é importante e fundamental para a formação dos futuros mestres e doutores, porém, acredito que isso não seja suficiente para reduzir o “gap” que existe entre a produção e o impacto das pesquisas na escola (quando esta é o cenário ou pano de fundo do estudo).
Outra questão fundamental, a qual não pretendo aprofundar, é a do financiamento das pesquisas na forma de bolsas de estudo cedidas pelas agências de fomento. Ou seja, dinheiro público é investido em diversas pesquisas que não dão qualquer tipo de retorno à escola pública.
Já ouvi algumas vezes a frase “dissertação e tese não devem ser feitas para enfeitar estante de biblioteca”. Mas sinceramente? Ainda não tenho visto iniciativas efetivas de diálogos entre os resultados das pesquisas e a escola. Tudo bem, nem toda pesquisa é “diretamente” aplicável, no entanto, já acompanhei desdobramentos de teses de cunho teórico que trazem reflexões importantes para o cotidiano escolar. A crítica serve para mim também e eu sei que realizar um movimento nesta direção não é algo trivial pois requer além do propósito a determinação em implementar o diálogo entre a pesquisa e a escola. Percebo um movimento de inquietação em algumas pessoas que estão na universidade e talvez isso já seja o início para sairmos do cômodo posto de acadêmicos(as).

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Boas vindas

Caros professores,
sejam muito bem-vindos ao blog Ensinando Ciências na Escola! Aqui estou saudando todos os professores de ciências em formação, seja ela inicial ou continuada, todos aqueles que estão sempre à busca de novas informações, conhecimentos e estratégias de ensino. 
O Ensinando Ciências na Escola surgiu de algumas inquietações pessoais: 
1) a vontade de compartilhar minhas reflexões sobre o ensino de ciências e a educação de uma forma menos rígida daquela que costumo apresentar em meus artigos acadêmicos; 
2) a insatisfação com o modo como alguns membros da academia e do(s) governo(s) (ou seja, aqueles que são "autorizados" a falar sobre Ciência e sobre Educação para os professores que estão na escola básica) vêm abordando e buscando soluções para os problemas da escola; 
3) o estímulo pela troca de experiências entre aqueles que ainda estão em processo de formação inicial e os professores já atuantes nas escolas;
4) o desejo de divulgar iniciativas e materiais didáticos produzidos por licenciandos e professores de ciências (biologia, química e física), além de resultados de pesquisas acadêmicas que eu e outros participantes do blog considerem bacanas de serem compartilhados.
Provavelmente, nem todas as insatisfações serão solucionadas pela mera existência do blog. No entanto, o simples fato de ter criado esse espaço já constitui um movimento significativo em minha trajetória.
Peço a você, leitor, que participe, interaja e publique suas experiências. Solicito também a divulgação entre seus pares.
Assim sendo, está oficialmente inaugurado o Ensinando Ciências na Escola!
Tatiana Galieta
Licenciada em Ciências Biológicas pela UFRJ
Professora da Faculdade de Formação de Professores - UERJ
Contato: tatigalieta@gmail.com

Algumas palavras de Freire...

"E não se diga que, se sou professor de biologia, não posso me alongar em considerações outras, que devo apenas ensinar biologia, como se o fenômeno vital pudesse ser compreendido fora da trama histórico-social, cultural e política. Como se a vida, a pura vida, pudesse ser vivida de maneira igual em todas as suas dimensões na favela, no cortiço ou numa zona feliz dos 'Jardins' de São Paulo. Se sou professor de biologia, obviamente, devo ensinar biologia, mas ao fazê-lo, não posso secioná-la daquela trama."

Paulo Freire, Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido.