segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Por que o professor que estuda mais sai da escola?



Em um determinado momento de minha trajetória profissional “tive” que escolher: ou seguia dando aulas no ensino fundamental ou dava continuidade aos estudos. Tinha meus projetos pessoais e também queria fazer bem feito aquilo a que eu me propusse fazer. E não vou mentir: tinha que avaliar as condições financeiras que enfrentaria ao longo de minha vida. Será que é apenas visando o acréscimo do salário (que todos nós sabemos que é ínfimo) que alguns professores dão prosseguimento formal e sistematizado aos seus estudos?
Fiz questão de destacar os termos acima porque, para mim, é quase óbvio que professor que não estuda tem sua morte intelectual decretada uma semana depois de sua formatura (e não estou me referindo apenas a atualização de conteúdos). Dizem que essa é uma verdade para qualquer profissão no mundo atual no qual a produção de conhecimentos se dá em uma velocidade absurda e sua divulgação e acessibilidade (via televisão, rádio e, principalmente, Internet) está aí para quem se interessar. Nossa profissão, especificamente, requer o contato com o que está sendo pensado e produzido por outros educadores, além de filósofos, psicólogos e sociólogos da educação. A ideia de que o conhecimento e as experiências devem ser compartilhados entre aqueles que estudam e vivem a realidade da educação e do ensino não é apenas um chavão é, sim, uma demanda concreta de aprimoramento do trabalho docente.
Voltando à questão que intitula este post: por que será que o professor que estuda, que se especializa em sua disciplina, acaba saindo da escola? Tem professor mestre ou doutor em escolas públicas (por favor, excluam os Colégios de Aplicação, o Pedro II e os Colégios Militares) e na grande maioria das escolas particulares? Sabemos que a resposta é negativa. Baseada no que tenho vivenciado na minha ainda curta experiência profissional posso dizer que boa parte de meus ex-licenciandos que fizeram mestrado, ao avistarem a possibilidade de receberem bolsas, abandonaram seus cargos nas escolas. Isso aconteceu comigo. Minha pergunta é: por que esses professores não voltam para as escolas ao término da pós-graduação stricto sensu? Sabemos que hoje existem os mestrados profissionais que pretendem justamente aprofundar a formação dos professores atuantes nas escolas visando, em última instância, a melhoria do ensino. Posiciono-me favorável a realização desses cursos desde que eles não se tornem uma mera “capacitação de luxo” de longa duração em centros universitários de excelência. A realidade é que boa parte daqueles que optam pelo mestrado (acadêmico), quando conseguem a licença ou o afastamento remunerado nas redes municipais e estaduais, retornam às escolas desestimulados e ansiosos por voltarem (definitivamente) ao ambiente acadêmico. É triste constatar que a escola é um objeto de estudo que rende dissertações e teses em um número gigantesco a cada ano e que os próprios professores, quando assumem o papel de pesquisadores, acabam se afastando daquele cenário (algo que não pode ser naturalizado e que devemos refletir a respeito).
Faço, ainda, outra pergunta: a rotina do profissional da educação faz com que ele tenha que optar, em algum momento, pela academia ou pela escola? Quando emprego o verbo Ter estou ressaltando a obrigatoriedade da escolha, ou melhor, a impossibilidade de conciliação entre o estudo, a pesquisa e a atuação docente. Tem como continuar sendo professor (na escola) e assumir o papel de pesquisador (na universidade) sem que haja uma sobreposição de papeis? Esse perfil profissional seria interessante para as duas instituições? Alguns poderão (apropriadamente) mencionar perspectivas teóricas e metodológicas como a pesquisa-ação ou os estudos sobre professores pesquisadores. Mas não são a estas “saídas” próprias da academia a que me refiro. Estou tentando suscitar uma questão muito mais de cunho prático (e, convenhamos, são com questões pragmáticas que o professor lida no seu dia a dia) que nos leva a refletir sobre as reais demandas do professor e das possíveis (e concretas) relações que um professor que está na escola pode estabelecer com a universidade (sem que ele tenha que optar por uma delas!). Neste momento, os formadores de professores (estou inclusa aqui) retrucarão: “temos projetos de extensão, promovemos cursos de formação continuada, organizamos eventos científicos que buscam o diálogo com o professor da escola”. Correto. Mas, ainda assim, parece haver aí um interstício considerável no que diz respeito à aproximação do professor com aquilo que está sendo pensado na academia. Não é a toa que os professorem frequentemente reclamam das pesquisas que não retornam à escola e das imposições que vêm de “cima para baixo”.
No final das contas, uma coisa não podemos deixar de reconhecer: ao ocupar o status daquele que “discute de fora” a educação, o professor jamais voltará a ser o mesmo. Se isso é bom ou ruim deixo para que cada um que viveu (vive) a situação que reflita e compartilhe com seus pares.
Devo confessar que acerca desse assunto possuo muito mais perguntas do que propriamente respostas definitivas. Algo que, por um lado é angustiante, mas que por outro tem me estimulado a refletir sobre as questões mencionadas.
Depois que sai da escola, tornei-me estudante de pós-graduação e já ao final do doutorado assumi o cargo de professora universitária. Assim, somente retornei a ela na figura de professora supervisora de licenciandos que estagiavam na educação básica. Outro lugar social, um olhar distinto sobre as relações que acontecem na escola. Esta mudança certamente suscitou em mim inúmeras perguntas – algumas delas eu venho buscando transformar em questões de pesquisa – e explorarei outras aqui no Blog em devidas oportunidades.

Um comentário:

  1. Olá Tatiana e demais colegas
    É essa parece ser uma regra, mas há exceções. Eu, por exemplo, estou na pós-graduação desde a minha especialização em ensino de Biologia pela UFF em 1992. Lá fiz uma especialização interdisciplinar na qual pude discutir muitos aspectos do ensino de ciências. Na época dava aula na escola privada e pública. Depois em 2003 entrei para o mestrado em Educação na UFF na linha de pesquisa educação em ciências, estudei o laboratório de ciências nas suas possibilidades e limites para o ensino de ciências. E agora termino o doutorado em educação em ciências e saúde no Nutes e ainda estou em sala de aula, agora apenas na escola pública. Então no meu caso eu diluí o estudo nos anos de trabalho de sala de aula. Agora prestes a me aposentar vou de fato sair de sala de aula e talvez se tudo der certo trabalhar com formação.
    Foi bom deixar aqui minha contribuição, e uma coisa é certa adoro ser professora de ciências!!! bj
    Cristina Moreira

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