Outro dia li em um Blog uma pessoa comentando: ninguém quer ser professor de escola pública. Afinal, são péssimos salários, condições de trabalho horripilantes e alunos cada vez mais indisciplinados. Dias antes havia lido em uma revista de divulgação científica muito conceituada, na coluna de um cientista da área das ciências duras, sua sentença de que os cursos de licenciatura em Ciências Naturais (especificamente Biologia e Química) necessitavam de uma ênfase maior no conteúdo (sobretudo de Física). Alguém poderia palpitar sobre a formação inicial deste cientista? Sim, coincidentemente ele é físico "hard". Hoje vi em alguma postagem no Facebook a opinião de algum colunista ou blogueiro de que os graduandos estão saindo das universidades quase tão semi analfabetos quanto entraram.
Quando me deparo com essas "verdades" que são jogadas na Internet e que vários assumem para si mesmos e propagam por aí, dois pensamentos me ocorrem: o primeiro, tem gente que não é do meio querendo dar pitaco onde não é especialista e acaba falando besteira; e o segundo, não há como desvencilhar a formação inicial dos futuros professores daquela educação básica que eles tiveram nas escolas. Sobre o primeiro pensamento eu não irei me deter, de forma direta. Porém sobre o segundo gostaria de fazer algumas considerações.
Como os cursos de licenciatura são menos visados e a concorrência é pequena (na área das Ciências Naturais a relação candidato vaga é baixa), acabamos tendo quase uma paridade entre alunos oriundos de escolas públicas e escolas particulares. Para não dizerem que estou cuspindo dados, baseio-me no censo deste ano da universidade na qual sou professora (UERJ) para fazer esta afirmação. A UERJ tem suas particularidades (sobretudo por ser pioneira no Estado do Rio de Janeiro no sistema de implantação de cotas) porém acredito que esta estatística possa ser encontrada nas demais universidades. Desta forma, temos universitários que passaram sua vida toda na escola pública, sofreram de todas as suas mazelas e compartilharam de suas qualidades. Neste ponto eu gostaria de focar em algo que não tem relação (direta) com a formação científica destes licenciandos, mas sim com a formação geral, em todas as disciplinas, que eles deixaram de ter na educação básica.
Sinto que os licenciandos não têm tantos problemas com a língua portuguesa. Existem alunos que escrevem "trasmição"? Existem. Mas isso não é crítico, na grande maioria dos casos. Meus alunos sabem se expressar, escrevem de forma coerente e coesa. No entanto, falta-lhes um componente essencial: cultural geral. Eles leram pouco, eles sabem pouquíssimo da história do Brasil, estão pouco antenados com questões políticas e econômicas atuais e, o pior de tudo em minha humilde opinião, não têm capacidade de se colocarem criticamente frente ao que lhes está sendo dito (estou aqui referindo-me especificamente aos alunos do primeiro período, os quais passaram anos na escola sendo "domesticados" e "podados"). Uma escola que não forma pessoas capazes de questionarem todo e qualquer assunto com o qual elas tenham contato não pode ser considerada uma boa escola. Independente de ser pública ou particular. Sinto falta de alunos que olham nos meus olhos e me desafiam. Afinal, o que será do futuro da escola pública se não tivermos professores desafiadores e questionadores do sistema?
Por outro lado, eu tenho sido confortada quando estou com os alunos de períodos mais avançados. Os licenciandos do quinto período, por exemplo, não se convencem tão facilmente. Já têm suas visões de mundo e da docência mais elaboradas e têm me feito pensar, inclusive, sobre aspectos do magistério que eu jamais havia considerado. Ou seja: há esperança.
Não acredito que os licenciandos do curso onde dou aula sairão semi analfabetos, nem linguística, nem politicamente falando. Também não acho que eles precisam saber mais física e mais química. Eles precisam, sim, entender que física e química são fundamentais para a compreensão de fenômenos naturais os quais ao serem ensinados por um professor de biologia deve ser abordados da forma menos compartimentalizada possível. E, finalmente, não acho que nossos futuros professores não atuarão em escolas públicas. Eles estarão lá, fazendo no dia a dia, uma escola pública de qualidade e igualdade, para todos e com todos.
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