domingo, 28 de abril de 2013

Há o que comemorar no Dia da Educação?

      Hoje, dia 28 de abril, comemora-se o Dia da Educação. E daí me vem logo à mente a pergunta: o que seria da Educação sem os educadores?
      Em post anterior eu cheguei a comentar sobre a inadequada redução da Educação ao Ensino. Acredito que ao fazermos isso restringimos a atividade docente à transmissão de conteúdos. Ensinamos muito mais do que isso, não é mesmo?
      Concordo plenamente que os alunos devem ser educados em casa, pelos pais. Sou mãe também e sei que não devo delegar minhas atribuições às professoras de minha filha. Mas não podemos nos isentar de nossa responsabilidade na formação dos valores e do caráter dos educandos. Eles, muitas vezes, ficam mais tempo conosco, na escola, do que com seus próprios pais. Somos exemplos para tudo e qualquer situação de vida. Porém, não somos sujeitos que vivem em um universo paralelo e trabalhamos sob condições que nos são impostas pelo Governo em suas diferentes instâncias.
      Por isso, gostaria de aproveitar a data para comentar outro ponto: o quanto a Educação tem recebido de investimento em nosso país. Até que ponto a Educação tem sido considerada prioridade pelos nossos governantes? Em reportagem recente na revista Nova Escola (abril/2013) comenta-se um dos motivos pelos quais o Plano Nacional de Educação, que deveria estar em vigência desde 2011, ainda não foi posto em ação: o valor que deve ser investido na Educação.  De acordo com a revista, “o Brasil e a Coreia do Sul investem praticamente o mesmo percentual do PIB em Educação”, porém ocupamos posições bem distantes no Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos). Por que essa diferença? O Brasil gasta 2.647 dólares por aluno por ano – na educação básica e ensino superior – enquanto que a Coreia do Sul gasta três vezes mais (a título de curiosidade os EUA gastam mais de 15.000 dólares por aluno). Sem mencionar a “dívida” histórica que o Brasil tem devido ao descaso com a Educação pública há mais de um século. A reportagem conclui que “dinheiro por si só não é capaz de resolver de forma mágica nenhum problema de nosso ensino. Para que isso aconteça, é preciso garantir a boa gestão do investimento”. Concordo plenamente. Em tempos em que tablets são comprados e distribuídos de forma pouco criteriosa por algumas secretarias de educação há mesmo que se repensar a gestão dos recursos destinados à Educação.
      Para encerrar, coloco duas questões: como, nós educadores, que prezamos pela qualidade da Educação pública brasileira, poderemos continuar nos dedicando à melhoria do ensino se nem um Plano Nacional de Educação consegue ser aprovado por conta de questões financeiras? Se a Educação não é prioridade, como não nos sentirmos abandonados pelo Estado? Muitos de nós estão desistindo, outros resistem, mas não podemos deixar que continuem passando a imagem de que a “culpa” pela “má” qualidade da Educação no Brasil deve-se ao desinteresse e descompromisso dos professores. Questionemos, junto toda a sociedade, essa transferência de deveres referentes à Educação.
 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

A ilusão da solidão no ato educativo


Não. Não estamos sozinhos. Tem muita gente querendo mudar o mundo em que vive pelo simples fato de não gostar desse mundo que está aí.
Ontem assisti à aula magna proferida por uma juíza na faculdade onde trabalho e tive a grata surpresa de saber que têm pessoas que pensam como eu, que compartilham de alguns ideais e, o mais importante, estão atuando de alguma forma em busca da mudança. E eu acredito que a mudança começa no âmbito individual, não como uma imposição de fora para dentro, visando apenas à mudança de comportamentos ditada por aqueles que detêm o poder. Mas sim naquela mudança baseada na conscientização e na emancipação que somente é possível quando o sujeito se apropria do conhecimento e questiona o seu lugar e sua função na sociedade. Aí sim, ele consegue questionar a própria sociedade em que ele participa e contribui para sua constituição.
É aqui o lócus da escola, da universidade, da educação formal de uma forma mais ampla. Nós professores ensinamos conteúdos, valores, atitudes por meio de nossas aulas e nossos exemplos. E se perdermos a esperança de que temos um papel essencial para a transformação perderemos a própria essência do ato educativo.
Eu quero sim que meus alunos, futuros professores de ciências, sejam reflexivos e críticos. Quero também que eles conheçam e ensinem (bem) os conteúdos das Ciências Biológicas, que se mantenham atualizados, que percebam que eles produzem conhecimento. Mas também almejo que eles sejam criativos - algo que a juíza mencionou ontem em sua aula. Como ela mesma disse: "há espaço para o novo". Na escola não ensinamos apenas o conhecimento, a cultura que foram produzidos e acumulados ao longo da história pela humanidade. A escola se reinventa a todo momento e o professor criativo é responsável por isso, pela mudança.
Se, por um lado, esse mundo pós-moderno nos dá a sensação de que somos cada vez mais fragmentados e, ao mesmo tempo, compartilhamos de "verdades" as quais nem nos damos conta que temos, por outro, estamos aí: agindo no mundo o tempo todo.
E quando esse agir é consciente, ele passa ser libertador. E, então, já não estamos mais sozinhos.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Sobre a "perda" de tempo na escola

Escola virou sinônimo de chatice, obrigação, perda de tempo. Afinal, com tantas coisas mais interessantes para se fazer para que ir à escola?
Tem muito aluno que pensa e fala isso mesmo. Mas será que isso é verdade para 100% dos alunos em todos os momentos de sua vida? Sinceramente, não acredito. Afinal, onde conhecemos (e convivemos) com pessoas de nossa idade, fazemos amizades, falamos besteiras, criticamos nossos pais, compartilhamos nossas ideias, marcamos o cinema, comentamos sobre um novo vídeo no YouTube? E por aí vai...
A escola é esse espaço que não serve "apenas" para ensinar e aprender conteúdos. Nela, enquanto alunos, passamos a nos constituir como seres sociais. Acontece que nós professores - e todo o sistema educacional - damos tanta ênfase ao conteúdo (e tudo que decorre daí) que os alunos realmente passam a acreditar que somente vão à escola para decorar coisas, fazer provas e passar de ano. Não estou querendo dizer que não temos a obrigação de ensinar conteúdos científicos pelos mais diversos motivos. Claro que temos! Mas o ensino das ciências não pode se reduzir a isso (algo consensual entre a comunidade acadêmica) e, de fato, nunca se reduz. No entanto, temos que fazer com que nossos alunos percebam que não estão indo à escola "apenas" para perder tempo de suas preciosas infâncias e adolescências.
Quando os alunos se divertem e conseguem perceber relações entre as perguntas que movem suas vidas e as questões centrais das ciências eles sentem prazer em ir à escola. Não é a toa que existem os professores preferidos, aqueles cujas aulas todos aguardam com ansiedade e, anos depois, são lembrados com tanto carinho. Será que esses professores são "apenas" empáticos? Que técnica seria essa que prende a atenção dos alunos e os fazem esquecer do celular?
A escola se reinventa o tempo todo simplesmente porque ela é feita por pessoas. E gente é inquieta. Crianças e adolescentes, então... E todos eles estão cada vez mais antenados, plugados e conectados. Não sou muito adepta desse discurso de que a escola tem que incorporar as novas tecnologias para "atrair" a molecada. Não é isso que garantirá a melhoria do ensino tampouco da escola pública.
A escola por ser esse organismo vivo é complexa e dinâmica. Mas por que será que os alunos têm a impressão de que ela é lenta, estática e parece que parou no tempo? Não se trata de buscarmos culpados mas talvez de refletirmos um pouco sobre essa visão dos estudantes.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Ensinar requer afetividade e amorosidade pelo aluno


             O título deste post é de minha autoria porém os créditos são todos de Paulo Freire. Essa afirmação veio-me à mente em uma situação emblemática de minha atuação como professora do ensino fundamental. Algo que eu acredito que 99,9% dos professores já enfrentaram.
               Não me lembro ao certo em que bimestre estávamos. Era uma turma de 6ª série (7º ano atual), mais especificamente, a turma 62 que tinha alunos de variadas personalidades. Gostava de dar aulas naquela turma mas o ambiente estava ficando cada vez mais tumultuado por causa de alguns alunos agitados. Um deles era o Filipe. Ele era um menino que gostava de chamar atenção dos colegas, fazia piada de qualquer coisa que eu ou algum outro aluno dissesse e estava, além dos problemas de comportamento, com notas baixas em várias disciplinas.
            O Filipe estava começando a fazer com que eu atingisse o meu limite de paciência. Sentia que ele estava me desafiando, testando. Porém, eu decidi que não iria confrontá-lo perante a turma. Senti que era isso o que ele queria. Então, minha primeira providência (frustrada, diga-se de passagem) foi chamá-lo para uma conversa fora da sala. Disse a ele alguma coisa do tipo: “Filipe, eu sei o que você está tentando fazer comigo, com os outros professores. Isso não é legal para você, nem para mim ou seus colegas. Acho melhor você começar a se comportar porque quem mais perde com isso é você”. O discurso cheio de moral  não serviu para nada e ele continuou fazendo as brincadeiras como de costume.
            Quando eu já não suportava mais a situação, pois ele e alguns outros alunos estavam impedindo que eu desse aula, me veio esse pensamento: “Paulo Freire disse que é preciso ter amor e respeito ao educando”. Não que eu não gostasse do menino, muito pelo contrário, acontece que nessas ocasiões você perde seu centro. Fiquei repetindo essa frase como um mantra até que me veio a ideia: faria do Filipe meu aliado, assumiria para mim mesma o desafio de torná-lo o aluno mais participativo e que se sentisse amado e respeitado por mim. Certamente que a ocasião propícia para colocar isso em prática não demorou para acontecer. Em algum momento da aula ele fez uma piada. Ao invés de chamar sua atenção ou agir de forma punitiva cheguei perto dele e fiz algum comentário bem baixinho e engraçado sobre o que ele tinha acabado de dizer em alto e bom som a todos da turma. Ele riu e o resto do pessoal ficou curioso para saber o que eu tinha falado. Pronto! A partir desse dia, as coisas entre nós melhoraram consideravelmente. Não que ele nunca mais tenha agido daquela maneira típica de adolescente só que ele não atrapalhava mais minhas aulas porque quando eu pedia para parar ou para ele dar uma segurada ele se controlava.
            Eu e Filipe temos contato até hoje (um viva para as redes sociais!) e pedi autorização a ele para usar seu verdadeiro nome neste texto. Acho essa coisa de pseudônimo muito chata nos textos acadêmicos. E ele acaba de me lembrar que em uma festa surpresa de aniversário que ele e os colegas organizaram para mim eu dei o primeiro pedaço de bolo para ele. Não foi uma “tática” ou “estratégia” para mantê-lo na linha não. Foi um gesto de coração porque ele se tornou um dos meus queridos alunos com os quais eu aprendo tanto sobre ser professora e como me tornar uma pessoa melhor. Um abraço apertado, querido Filipe Francisco!

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Voz do Professor - Kristian Wessman

Inicio este depoimento lembrando do meu discurso de quando entrei na faculdade de Biologia, em que dizia que somente me tornaria professor se tudo desse errado. Era o meu plano B. E foi com este espírito que trilhei a minha graduação, buscando desde o princípio laboratórios de pesquisa onde pudesse dar início ao meu objetivo de seguir a carreira de pesquisador. O curioso desta escolha é que ela foi baseada principalmente nas imagens que cada uma das carreiras passam para a sociedade. O pesquisador sempre é uma pessoa bem sucedida e respeitada, já o professor... Bem, o professor é aquele coitado que ganha um salário de fome e constantemente é desrespeitado por governos, pais de alunos e alunos, não necessariamente nesta ordem. Foram com estas impressões que entrei na faculdade e são estas impressões que continuo vendo atualmente em sala de aula quando consulto os alunos sobre que carreira pretendem seguir.
Pois bem, então por que me tornei professor? Simplesmente porque estas duas imagens com as quais entrei na faculdade foram modificadas ao longo do tempo. Vi que a pesquisa não é, principalmente no Brasil, tão valorizada quanto parece. Existe a carência de bens materiais e material humano para que realmente ela se desenvolva. E ao mesmo tempo, pude presenciar ao longo na minha prática de ensino que aqueles “monstros”, também chamados de alunos, não eram tão perigosos assim. Foi na prática de ensino que percebi como ser professor pode modificar de forma muito mais imediata a sociedade. Ou seja, encontrei na sala de aula o que já não encontrava no laboratório: uma função clara e imediata para tudo o que havia aprendido na faculdade.
Assim que conclui a graduação, já me vi atuando como professor nas redes pública estadual e privada. E vi que, principalmente na rede pública, existe uma tendência a esperar que as mudanças aconteçam. Porém eu acredito que nós devemos ser parte da mudança. Neste momento ouvi muito aquele discurso de que eu queria mudar a escola porque ainda estava cheio de gás, recém-formado, que o tempo me mostraria que de nada adianta nossa vontade. Ou seja, dificilmente encontrava palavras animadoras vindas de colegas, principalmente daqueles que já tinham mais tempo de profissão.
Entretanto sou inquieto por natureza. Não gosto de perder tempo esperando as coisas acontecerem. E felizmente fui lotado em uma escola onde os diretores dão liberdade para que projetos sejam propostos e executados. E o meu projeto pessoal foi transformar uma sala ociosa em laboratório de Ciências. O início de 2009 foi marcado pelo improviso, com mesas de refeitório sendo usadas como bancadas. Este simples fato fez com que os alunos se aproximassem e se interessassem mais pelas aulas. A impressão que tenho é que perceberam o meu interesse em modificar algo e resolveram retribuir com o interesse deles.
O ano de 2010 foi marcado por duas gratas surpresas. A primeira foi a liberação de uma verba por parte do governo federal para a execução de um projeto proposto pela escola. A verba foi transformada em pequenos insumos para realização de aulas práticas e bancadas de laboratório, e assim as mesas improvisadas retornaram para o refeitório. A segunda foi a aprovação de um projeto de extensão universitária para ser executado em 2011. Através deste projeto, inúmeros materiais foram comprados para equipar o laboratório e posso dizer que hoje tenho à disposição uma estrutura que dificilmente é encontrada em escolas da rede estadual para o ensino de Ciências. O laboratório conta com frigobar, placa aquecedora, modelos anatômicos, computador, microscópio e lupa com câmera para exibição no data-show, vidrarias, entre outros materiais. Este projeto trouxe ainda o programa PIBIC-EM para a escola, e ao longo de 2012 tivemos um aluno bolsista do CNPq realizando um projeto sob minha orientação e do grupo parceiro em extensão universitária.
Creio que não preciso descrever o quanto estes projetos modificaram para melhor o interesse dos alunos pelas aulas de Biologia. Hoje sou cobrado quando passo muito tempo sem dar aulas neste espaço, e até mesmo pais de alunos já cobraram que os professores da escola utilizassem este espaço mais vezes. É gratificante perceber que os frutos deste projeto já são colhidos. E sempre que vejo estes frutos, me pergunto onde estariam se eu tivesse dado ouvidos aos que me disseram que de nada adiantaria a minha vontade em mudar a realidade. Não quero com isto dizer que problemas não existem (e são muitos), mas sim que não devemos nos entregar a eles.
Kristian Wessman - Professor de Ciências e Biologia das redes públicas estadual e municipal do RJ e da rede particular. Aqui descreve sua atuação no CIEP 369 Jornalista Sandro Moreyra em Duque de Caxias, RJ.